O QUE É CONDUÇÃO COERCITIVA?



Aproveitando a polêmica que tomou conta dos noticiários na manhã de 04/03/2016, após a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dediquei algumas horas para traçar breves linhas sobre este procedimento processual tão comum nas ações da Polícia Federal, mas quase relegado pelos processualistas brasileiros. A condução coercitiva.

Trata-se de uma abordagem puramente técnica, sem qualquer pretensão de entrar no mérito da medida expedida contra o ex-presidente.
A condução coercitiva é uma medida cautelar de caráter pessoal através da qual a pessoa tem a sua liberdade parcialmente restringida, pelo lapso temporal razoável e necessário, independentemente de sua vontade, ao ser levada à presença de uma autoridade policial ou judiciária ou ao membro do Ministério Público, com o objetivo de prestar esclarecimentos sobre um fato penalmente relevante.
O fundamento legal da medida encontra-se no art. 260 do Código de Processo Penal:
        Art. 260.  Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

Note-se que o referido artigo tem uma redação que remonta da década de 40 do século passado, carecendo, portanto, de uma releitura mais consentânea com a nova ordem constitucional. Isto porque uma interpretação literal do dispositivo transcrito nos levar a crer que a ordem de condução coercitiva pode emanar não só do juiz, mas também de uma autoridade policial ou mesmo do Ministério Público.
Malgrado não se confunda com qualquer espécie de prisão, a condução coercitiva se revela como uma medida fundamentalmente restritiva da liberdade de locomoção e, como tal, está sujeita à cláusula de reserva constitucional. Vale dizer, somente a autoridade judicial tem competência para expedir uma ordem desta natureza. (Em sentido contrário, admitindo a expedição da ordem por parte da autoridade policial, vide HC 107644/SP – STF 1ª Turma. Rel. Ricardo Lewandowsk – 06/09/2011)
Tal regra está expressa no art. 282, § 2º, do CPP, com a seguinte redação:
Art. 282. (...)
§ 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público.
Conquanto não prevista no rol de medidas cautelares dos arts. 319 e 320 do CPP, condução coercitiva tem natureza de medida cautelar de caráter pessoal, recaindo sobre a liberdade de locomoção do investigado e tendo por objetivo de auxiliar nas investigações e, por conseguinte, garantir o provimento final do processo.
Note-se que o princípio da presunção de inocência obsta uma antecipação do juízo de culpabilidade, fazendo com que a condução coercitiva, assim como qualquer outra medida cautelar, seja requerida e, sobretudo deferida, diante de elementos fáticos concretos que justifiquem a necessidade de se acautelar o futuro provimento jurisdicional através das citadas medidas processuais. Não se admite, portanto, a intromissão estatal na intimidade dos cidadãos estribado apenas em meras conjecturas ou simples especulações, especialmente quando se trata de uma intromissão inaudita altera pars.

Apenas para fins didáticos, a condução coercitiva pode ser seccionada em duas fases: a primeira é a condução obrigatória à presença da autoridade. É ato que independe do consentimento do investigado. A segunda é o fornecimento de declarações por parte do conduzido coercitivamente. Trata-se de ato voluntário que depende do consentimento do investigado, face ao princípio do nemo tenetur se detegere, ou seja, a garantia constitucional de não autoincriminação.


Outra questão bastante tormentosa diz respeito à possibilidade de se algemar o conduzido. De acordo com os termos da Súmula Vinculante nº 11 do STF, o uso de algemas somente se legitima em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros. Ora, o conduzido não é preso e, portanto, não deve ser algemado, exceto se opuser resistência ao ato de condução.
Até a próxima!!
Humberto Brandão

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